domingo, 14 de fevereiro de 2010

É que é mesmo isto...


O tempo está para o amor como o vento para os incêndios; apaga os fracos e ateia os mais fortes. É uma espécie de teste, uma prova cega, uma forma inequívoca de clarificar a essência daquilo a que tantas vezes queremos chamar amor e que ainda não é mais do que o minúsculo
embrião de futuro incerto e tantas vezes improvável.

O tempo está para o amor como o vento para os incêndios. Alastra repentinamente, traiçoeiro e sem aviso, vai para lugares onde nunca pensamos que pudesse sequer chegar, faz-nos tremer, sofrer, rezar, dá-nos vontade de lutar para o combater, porque não sabemos para onde vamos, o que queremos nem se seremos os mesmo depois do fim... e por isso receamos o fim antes mesmo do princípio, imaginamos cenários apocalípticos para proteger o coração cansado e errante que não quer ainda, apesar de tudo, parar para pensar ou escolher um lugar.

O tempo está para o amor como está para tudo o resto na vida. É o tempo que nos dá maturidade, que nos ensina a distinguir o que é urgente daquilo que é mesmo importante, que nos mostra onde estão os verdadeiros amigos, que nos dita quais os princípios pelos quais nos
regemos e como deveremos lidar com as nossas fraquezas. O tempo ensina-nos a viver com os nossos defeitos e a respeitar as diferenças dos outros. Dá-nos sabedoria, tolerância, paciência, distância, objectividade, clareza mental. Afasta as dúvidas e as hesitações.
Poupa-nos de decepções e enganos. Abre-nos os olhos quando somos os únicos a não ver. E dá-nos força para continuar, mesmo que o amor seja uma ausência, uma perda, uma falta, uma desilusão.

Mas o amor está para o tempo como uma vela acesa numa noite de luar. O amor é trémulo, impaciente, frágil, volúvel, fraco, fácil de acender.
Tantas vezes se consome a si próprio, tantas vezes é tão fácil de apagar, para depois se reacender, voltar a vacilar, incerto e inseguro, quente mas efémero, forte mas falível, romântico mas tantas vezes superficial...

O amor abre o coração, desprotege o espírito, acorda o corpo e aquece a alma. Pode nascer de um olhar mais longo, de uma conversa à mesa, de um passeio à beira-mar, da simples passagem da palma de uma mão por uma cintura desprevenida. Não tem regras, nem tempo, nem cores, porque não tem limites, nem compassos nem contornos. Por isso é que quando nos apaixonamos enchemos páginas inúteis com os defeitos e qualidades do nosso amado sem chegarmos a nenhuma conclusão. E ao vermos nele alguns defeitos que tanto abominamos, condescendemos, abreviamos, contemporizamos e deixamos passar. Porque o verdadeiro amor é aquele que resiste ao tempo, sobrevive às dúvidas, emerge do medo e aprende a dominá-lo.

Amar é outra coisa. É dar sem pensar, é sonhar o dia todo acordado e dormir sem nunca adormecer, é galgar distâncias com agilidade e destreza, é viajar sem sair de casa, escolher livros e programar surpresas, namorar o telefone à espera que ele toque, acordar depois de duas horas de sono com cara de bebé, sentir que somos invencíveis e que a perfeição está tão perto e é tão fácil, que a morte já podia chegar, sem termos medo de perder a vida.

O verdadeiro amor é absoluto, indestrutível, estóico, inflexível na sua essência e tolerante na sua vivência, discreto, sóbrio, contido, reservado, escondido, recatado, amadurecido, desejado, incondicional, amargurado, sagrado, sobressaltado. O verdadeiro amor é delicado, bom ouvinte, cúmplice, fiel sem ser servil, atento sem se impor, carinhoso sem cobrar, atencioso sem sufocar e muito, muito cuidadoso para nunca se perder, se estragar, se esquecer ou desvirtuar. O segredo está no tempero, na moderação, nas palavras que nunca se chegam a dizer, nas conversas perdidas à beira do rio, no olhar que fica no ar, no tempo que é preciso dar para que cresça, amadureça e deixe de meter medo.

É preciso dar tempo ao amor, um tempo sem tempo, sem datas nem prazos, sem exigências nem queixas, porque o amor leva o tempo que for preciso.

Obrigada M.R.P.!

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