domingo, 9 de agosto de 2009

Noite de Cinema...


Depois de uma tarde envolta em tristeza, a tristeza de alguém a quem quero particularmente bem, deprime-me sempre, o serão foi calmo e tranquilo q.b.

Ainda antes do simpático jantar, a opção havia sido uma ida ao cinema, por exclusão de partes, acabámos a ver o filme Duplo Amor.



Leonard (Joaquin Phoenix), um homem atraente mas perturbado, regressa à casa de infância após uma tentativa de suicídio. Enquanto recupera, sob o olhar atento dos seus preocupados mas, no fundo, pouco compreensivos pais (Isabella Rossellini e Moni Monoshov), ele conhece, quase ao mesmo tempo, duas mulheres.
Michelle (Gwyneth Paltrow), uma bela e misteriosa vizinha - exótica e meio deslocada no bairro de Leonard, Brighton Beach, que parece carregar consigo, também, sérios problemas. Entretanto, os seus pais tentam empurrá-lo para Sandra (Vinessa Shaw), a encantadora e atenciosa filha do empresário suburbano que vai comprar o negócio da família.

Numa primeira fase, não resistindo à sensualidade de Sandra (e à pressão da família), Leonard descobre, gradualmente, uma oculta intensidade emocional nesta mulher. No entanto, um potencial romance com Sandra é complicado.
Mas Michelle e a sua vida em espiral fora de controlo, agarrando-se à ajuda de Leonard para solucionar o caso destrutivo que tem com outro homem, também se tornam sufocantes para ele.


Quando Michellle parece estar condenada a apaixonar-se por Leonard e a família de Leonard o pressiona a comprometer-se com Sandra, ele vê-se forçado a tomar uma decisão impossível - entre a impetuosidade do desejo, arriscando-se a cair na obscuridade que quase o matou, ou o conforto do amor.

Amália Rodrigues serve de pano de fundo, várias vezes durante Duplo Amor. Canta Estranha Forma de Vida, como se tivesse sido escrita de propósito para o filme. É uma vida soturna, depressiva e francamente realista que James Gray nos apresenta nesta longa-metragem nomeada no Festival de Cannes e nos César Awards de 2008.

A expectativa era enorme à partida para ver este filme. Dos textos que havia lido, todos eles o referenciavam como um grande filme, um dos melhores de 2008. E a verdade é que nenhum deles se engana, a verdade é que é um filme fenomenal. Um drama romântico clássico que Gray filma magistralmente. Um Joaquim Phoenix portentoso, fabuloso e Paltrow a…impressionar.

Mas é todo o classicismo que preenche o filme, todo o ambiente que James Gray cria desde o início do filme que nos prende à obra.
Todo o desenvolvimento em tons de negro num caos hipotético que é criado dá a ideia que a história vai acabar mal, o que não é necessariamente mentira, dependendo do ponto de vista. Mas Gray cria uma mente instável e que nem ela própria sabe o que fazer, que caminhos tomar, porque o amor é aqui o grande âmago da história.
E se a história é banal, porque o é, a forma como é narrada, a mão de Gray transforma-a numa história emocionante e tocante. Porque o filme nunca cai em lamechices, porque apesar de Leonard passar à frente da tela quase o filme inteiro, porque apesar de Leonard tentar o suicídio logo no início do filme, apesar de toda a instabilidade mental e emocional (no inicio os pais falam em doença bipolar), apesar de quando rejeitado ele se desfazer em lágrimas, apesar disso tudo Gray nunca nos leva a um ambiente lamechas, ao típico ambiente novelístico do coitadinho que sofre por amor.
Não, aqui ele envereda por outra vertente, aqui ele fecha uma porta mas abre outra (relativamente a Leonard), aqui ele não cai no facilitismo de encontrar a tragédia que vai assolando o filme desde o início e cria uma história mais real, menos melodramática, mais credível.
E aqui não há final feliz nem trágico, há o final apropriado, o final mais real e credível para o senso comum, o final que nos deixa satisfeitos porque era o que nós faríamos.
E o amor é isso, é tentar tudo por ele mas parar quando se percebe que não há mais nada a fazer.

E é esse realismo sem ser exasperado que faz de “Two Lovers” um filme magnífico. São os planos magníficos que Gray filma que enaltecem a obra, a simplicidade de uma beleza ímpar de Gray filmar os pormenores, os detalhes para uns desnecessários que Gray prova serem necessários. É a beleza de Gray contar uma história de amor de modo arriscado mas competente, de modo a não cair nos clichés, de modo a fugir ao mainstream, de modo a retirar o que de melhor um actor pode dar ao filme.
Porque há realizadores que têm essa capacidade, esse dom de conseguirem arrancar uma portentosa interpretação a um mediano actor (o que não é o caso). E Phoenix transcende-se, mergulha na interpretação de uma vida e dá corpo a Leonard de um modo de tal apaixonante que sem ele o filme não alcançava tal proeza.

E a instabilidade emocional de Leonard oscila entre o amor obsessivo e incerto mas explosivo e cego, e a certeza de uma relação com futuro e lealdade mas que não ultrapassa essa calma e paz interior que lhe traz, essa consolação de ter estabilidade, essa paixão acesa que falta e que encontra na outra.
Por outras palavras, uma dualidade de atitudes que Leonard tem de adoptar, a escolha entre o amor e a razão, a decisão entre o que o coração lhe pede e o que a cabeça lhe indica.
E independentemente das condições que o fazem decidir, das adversidades que sucedem, Leonard vai ter que decidir. Porque o que Gray quer mostrar é o poder do amor vs o poder da mente, da “reabilitação”, da resignação – porque muito que custe, ela chega, porque nunca ninguém morreu de amor.
E o filme é isso, essa dualidade de sentimentos, esse conflito entre amor e razão, essa viagem emocional que Leonard vai fazer e que lhe vai deixar marcas.

E se o tema é banal, a realização, as interpretações, a luz e as sombras, a mise-en-scène de Gray torna tudo extraordinário, clássico.

P.S. - Amei!
Mesmo tendo "fechado os olhos" numa cena importante... era impossível que não acontecesse, embalada daquela maneira... Desculpa...

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