terça-feira, 10 de junho de 2008

Definitivamente, F. de Força...

O telefone tocou há pouco...
Do lado de lá da linha dizias-me o inevitável, aquilo que queríamos ouvir sem o desejar: "A F. já viajou."

Estavas por perto e isso certamente deu-lhe a tranquilidade necessária para partir em viagem...

Sem lágrimas e sem choro, estou a digerir...
A digerir a já grande Saudade de uma Mulher que me marcou profundamente.
Arrisco-me a dizer que a seguir à minha Querida Avó, foi sem dúvida a F., a Mulher que mais me marcou.

A F. é uma Guerreira. Será com esta palavra que a vou recordar Sempre.
Viveu intensamente cada momento da sua vida. Com uma entrega total, mesmo quando parecia não se entregar.

Como qualquer Guerreira, tinha uma máscara, forte, dura. Igual à máscara que Tu próprio usas. Uma máscara que, também, me ensinou a usar. Aprendi muito com ela. Muito mesmo.

Sempre me tratou com imenso carinho e respeito. Reciproco, claro está!!

Lembro-me do primeiro beijo que lhe dei, no jantar do Teu 30º aniversário, dia em que a conheci...

Lembro-me de como celebrámos o seu 50º Aniversário – a determinação e a alegria após o Salto Tandem – a adrenalina e a excitação...

Lembro-me da nossa ida ao cinema...

Lembro-me dos vasos de barro, de S. Pedro do Corval...

Lembro-me da nossa ida à praia...

Lembro-me dos almoços e jantares em Setúbal, na Ericeira, em Almeirim, no Indiano, no Chinês, no Asiático, no Hard Rock Café, da moamba, da massada de peixe...

Lembro-me do prazer que tive de a ter no meu 30º Aniversário e das flores, que não murcham, que me ofereceu...

Lembro-me dos travesseiros de Sintra e dos barretes de Salvaterra...

Lembro-me das pataniscas com arroz de feijão, claro...

Lembro-me dos caracóis...

Lembro-me das “caipirinhas” feitas especialmente para mim...

Lembro-me das flores que lhe dei e do sorriso que punha...

Lembro-me da nossa viagem ao Porto, para assistir ao Red Bull Air Race – no dia do seu 51º Aniversário. Do “lanche surpresa” e da cara que fez quando recebeu a massagem no Ritz (aposto que não a chegou a fazer)...

Lembro-me da limpeza na arrecadação, na cave...

Lembro-me da expressão que é, e será Sempre sua – “Boa!!!”...

Lembro-me de todas as vezes em que me (nos) desejou uma "noite boa"...

Lembro-me das vezes que me dizia: “ não desistas, não faltes, não deixes de ir”... Ontem, depois de me despedir de si fui... Fui porque me lembrei da frase: “não desistas, não faltes, não deixes de ir”...

Lembro-me do seu sorriso, já aqui partilhado, quando a surpreendi à saída do Bloco operatório, em Abril, no HSM...

Lembro-me das vezes em que me falou como Mulher e não como Mãe...

Lembro-me bem da expressão: "és uma Mulher ou um Rato?!"...

Lembro-me do dia em que me recebeu em sua casa, pela primeira vez...

Lembro-me tão bem... Lembro-me como se tivesse sido ontem...
Estávamos num dia histórico, como o de hoje - 5 de Outubro de 2006. Ainda que já nos conhecêssemos há uns meses... Para me receber, estavam maranhos e claro, pataniscas com arroz de feijão – feitas propositadamente para mim...
Pataniscas de Bacalhau que eu tanto gosto, na tentativa de compensar as pseudo-pataniscas de um jantar em Tróia, depois de um dia muito bem passado pela costa alentejana, de Tróia a Melides...
Os maranhos, algo inédito para mim, estavam muito bons! Mas as pataniscas... ficarão para Sempre.

Senti-me muito bem recebida. Vi-lhe a alegria no olhar. Vi que gostava, genuinamente de mim. Mesmo que o futuro fosse incerto.
Tão incerto que...

Depois desse jantar, foram mais uns quantos. Alguns deles, só as duas. Em casa mais dois... Num deles, só as duas..., muito bom!

O último foi a 13 de Janeiro. Sobre este jantar, já aqui escrevi subtilmente... Ligou-me para saber se tinha alguma coisa combinada. A noite estava livre e se não estivesse, certamente ficaria!
Estava sozinha e triste... Não que eu me sentisse muito melhor na altura, mas havia algo que nos era comum... a saudade. Inclusivamente, a de estarmos juntas.
Gostei que me tivesse chamado. Gostei que me tivesse escolhido para partilhar...
Mais uma vez, e só para mim... pataniscas!!
Nesse jantar, aprendi muito... Mais uma vez...

Pelo meio, os telefonemas. Igualmente recíprocos. Uns em que não se dizia muito e outros onde muito se dizia. Tanto que os braços ficavam dormentes ;-)
Falávamos essencialmente de nós. De como nos sentíamos. Do nosso dia a dia e claro, do que nos unia... De quem nos unia falávamos, inevitavelmente. Falávamos cada vez menos... era uma defesa. Um respeito mútuo.

Ainda me lembro de umas quantas vezes em que me ralhou...
Ralhava-me sempre que o estafeta lhe tocava à campainha para fazer entregas...
Já sabia que após o ok de entrega ia receber um “raspanete”.
Foi assim depois de regressar de Paris (ainda que dessa vez o "estafeta" fosse da casa). Foi assim no último Natal...
Ralhava mas compreendia-me. Ao mesmo tempo que achava graça.

Bem que podia ter mandado o estafeta entregar-lhe o presente que veio comigo da última viagem. Mas, para não se zangar, foi ficando... à espera do próximo jantar. Qual jantar?!... O que faremos um dia destes!

Há umas quantas semanas, no início de Abril, ligou-me e disse: “eu sei que já é tarde, mas até aposto que não almoçaste...”. Nem cinco minutos depois, estava à porta do meu local de trabalho, com um carregamento de pataniscas que fizeram as minhas delícias. Bom, mas bom!
Impossível de esquecer esta generosidade, carinho e entrega. Ficámos uns minutos à conversa.

Na semana seguinte, num lado ou noutro ia para o “hotel”, definitivamente, parecia a minha Avó a falar...
O jantar ficava mais uma vez adiado.

Na semana seguinte, impunha-se a conclusão de uma tarefa – um pé novo!!

Lá "quebrei" mais uma vez a minha promessa e fui vê-la, acabadinha de chegar com o seu pé novo!!
O pé que prometia laurear o verão inteiro com a sandalita da moda...

Pelo meio, uma preocupação... Um conjunto de análises e exames... cujos resultados estavam sempre bons, até um dia em que lá se decidiu a partilhar que afinal, não estavam assim tão bons. Seguiram-se uma série de exames complementares... sempre todos fáceis de fazer... Tão mentirosa.
O último não foi mesmo nada fácil...

O cansaço era cada vez mais evidente... a saturação... a tristeza...
Os telefonemas deixaram de ser semanais ou “bi semanais” e passaram a ser diários!
Todos os dias a obrigava a fazer-me um "relatório".
Todos os dias me ocultava alguma coisa, algo que para mim, e para a minha mãe (que também a "controlava") se tornava cada vez mais evidente.
Todos os dias me dizia: “nada. Não preciso de nada. Está tudo controlado”.

A quem é que eu já conhecia este discurso?!...
A Ti! Tão diferentes... tão iguais!

Na véspera dos últimos exames médicos, o cansaço era mais do que evidente. E a ansiedade também...
Alguém a quem quer(ermos) muito estava prestes a chegar. Era, sem dúvida A Pessoa mais importante...

Na última sexta-feira que esteve em casa ligou-me, à noite... Como sempre eu recusava para ligar em seguida. Falámos, falámos mas o cansaço impunha-se e obriguei-a a desligar. Com a promessa de falarmos no dia seguinte. E a promessa de um jantar no local onde eu estava a jantar, com direito a Tarte de Limão Merengada...

Não falámos no fim de semana... ficaram apenas mensagens no voice mail...

Voltamos a falar na segunda-feira... estava ao lado dela na “clandestinidade”, depois de mentir para conseguir entrar na unidade hospitalar.
“O que estás aqui a fazer? Como conseguiste?!” “Tu não existes”. Disse com um sorriso de orelha a orelha.
Chiuuuu” respondi-lhe em surdina. “Estou clandestina”.
Fiquei o tempo suficiente para lhe dizer: “estou aqui. Como sempre. Custasse o que custasse, até porque sou forte e tenho uma máscara ;-)” – repeti o que ao fim da tarde lhe havia dito ao telefone...
Voltou a olhar para mim com um sorriso de orelha a orelha. Saí e voltei a entrar – “só para dar um beijinho” dizia a enfermeira.
Rimo-nos à grande. Que ternura de sorriso!
Para não variar, mentiu... quer dizer, ocultou o que se havia passado durante o dia...
Fazia-o Sempre que não queria incomodar ninguém. Que é o mesmo que dizer: Fazia-o Sempre!

O sorriso que me dedicou, a alegria no olhar, a alegria da flor ao peito (a flor que não murcha) deram-me forças para estar ali todos os dias...
Todos, até ontem.

Ainda nos rimos, algumas vezes. Perguntava como é que eu estava, pelo L., pelos manos, por tudo. Dizia-lhe Sempre: “Força F. Estou aqui!” Mesmo quando era mais do que evidente que a Força começava a escassear...
Mas, afinal, até para decidir viajar é preciso ter Força.
A forma como olhava para A Pessoa mais importante, a forma como olhava para Ti era única... Que Amor, que entrega!

Tenho a certeza que me ouvia e reconhecia. Ontem não foi diferente...

Para Sempre vai ficar o polegar levantado e o sorriso com que nos despedimos no Sábado ao fim da tarde.

Para Sempre vai ficar tanta coisa....

Como já outras vezes disse, tantas vezes disse, outras tantas escrevi.
Como tantas vezes lhe disse... A forma da F. lidar com a vida, constitui para mim um exemplo e será Sempre uma referência.Um dia, quando for grande ;-) quero ter sua garra.

Não é à toa que se chama F.... Definitivamente, F. de Força!

Hoje, tenho a certeza que jamais irá ler estas linhas que lhe dedico e outras tantas que já lhe dediquei. Mas ainda assim, não hesito um minuto em falar dela. Lembrar-me-ei dela muitas vezes. Será Sempre uma pessoa a recordar, por tudo... sobretudo pelo carinho que Sempre me dedicou!

Obrigada por ser como é, pela Amizade, pelo Carinho, pelo Apoio, pelas Palavras Sábias, pelos Conselhos e pelo resto...

Um grande beijo, como o de ontem,
com muito Carinho e Admiração!

Gosto muito de si! Até Sempre!

P.S. - Aqui, neste filme da vida real,
hoje tão surreal, só quem não teve
oportunidade de escolher foi a F.
Nós, os que cá ficamos, bem ou mal...
vamos escolhendo...

Para Ti... Força! A Força, da tua (da nossa) da Guerreira.

1 comentário:

Anónimo disse...

Obrigado pelo teu carinho e atencao!
Beijos muitos

PS: Aposto que, como eu, ela ficou sem palavras... ;o)